A família a manchar um excelente manual
Rolando Almeida
Graficamente o trabalho da editora não será, porventura, o último grito, mas agrada-me bastante uma vez que os manuais cheios de fotografias idiotas conseguem cansar os estudantes muito mais rapidamente do que pensamos. O Criticamente é servido por uma bibliografia sofisticada e filosoficamente actual, para além de adequada. Em relação à organização do manual, pode-se apontar pequenos reparos. Por exemplo, no ponto 4 da unidade “Estatuto do conhecimento científico” dá-se algumas orientações bibliográficas, mas esta ordem não é mais seguida ao longo das outras unidades, o que revela algum desacerto na concepção do manual que pouco afectam a qualidade conjunta. Mas há um ponto neste manual que, incompreensivelmente, o mancha pela negativa. É uma espécie de nódoa no bom trabalho desenvolvido. Estou a referir-me à opção dos temas e problemas da cultura científico tecnológica, o tema 7 – «Podem as tecnologias reprodutivas pôr em risco aquilo que valorizamos na família?» Bem em primeiro lugar a “família” não me parece uma questão central dos problemas científico tecnológicos. Em segundo lugar toda a unidade deixa transparecer um certo discurso sobre a família como valor fundamental. Considera-se que a família oferece cuidados, afectos, pertença, etc. de modo insubstituível. Mas tal só é verdade dentro de um quadro social de referência, o que não invalida a possibilidade de argumentar em favor de outros quadros de referência. Ainda bem que se trata de um problema em opção.
É pena este senão deste capítulo, porque este é um manual de filosofia que qualquer professor se orgulhará de ter para os seus alunos. Lê-se com prazer, não encontrei nele os erros comuns nos manuais. Não tenho ideia de como a linguagem do manual funcionará com os alunos, mas estou convencido que funcionará com a clareza exigida. Trata-se, portanto, de uma das melhores opções, rivalizando entre os melhores.
Em termos comparativos com um manual que rivaliza directamente, O Arte de Pensar é mais fluido que o Criticamente, para além de mais acessível e atraente, provavelmente fruto da experiência dos autores. Claro que só adoptamos um manual, mas este Criticamente seria a minha opção certeira se o Arte tivesse esgotado e as adopções fossem livres, como deveriam ser. Portanto, caros leitores, quando me disserem que “há outros” aqui está o “outros” da minha preferência juntando ao pacote do Filosofia 11 da Plátano e o Arte de Pensar e na expectativa do Logos, que ainda não conheço.
Uma palavra também para o formato do livro: ele é pesado (a qualidade do papel obriga a que os manuais sejam excessivamente pesados), mas tem um formato que particularmente me agrada. Nada daqueles exageros quadrados a que as editoras muitas vezes nos sujeitam.
Artur Polónio, Faustino Vaz, Teresa Cristovão, Criticamente, Porto Editora, 2008