Não é fácil encontrar bons divulgadores da ciência e da filosofia em Portugal. Isto deve-se, em parte, por em Portugal ser praticamente impossível um autor viver dos livros que publica. Por outro lado em Portugal ainda existe muito difundida a ideia de que a cultura deve ser gratuita e não se paga. Era bom que assim fosse. Talvez desse modo a cultura não estivesse directamente dependente da indústria. Mas a continuar com tal ideia, a morte da cultura e da sua divulgação é um dado quase certo. Mas existem formas eficazes de combater este semi-deserto de publicações para o público em geral. O Estado Português gasta milhares de euros em apoios a teses de investigação que, na sua maioria, não contribuem para o bem público, mas antes, somente para o currículo particular. Muitos desses doutorandos e mestrandos financiados pelo dinheiro de todos, acabam a trabalhar no estrangeiro ou para universidades particulares. E esta é uma má política de investimentos porque o esforço no gasto do dinheiro público acaba, numa boa parte das vezes, por não possuir retorno. Uma das formas de exigir retorno seria exigir no contrato de atribuição de bolsas, a publicação de livros introdutórios para o grande público em cada área de investigação. Uma medida como esta incentivaria muito a fluidez e dinâmica cultural de um país. Um jovem estudante do ensino secundário teria dessa forma a porta aberta ao saber e conhecimento, partindo do contacto com essas obras. E esta tarefa não é muito complicada de se concretizar. Para além de tudo estava aqui a criar-se um novo mercado que ainda tem muito para dar no nosso país, o do empreendedorismo editorial (muitas vezes em Portugal pensa-se que empreendedor é uma palavra técnica exclusiva da gestão que nada tem a ver com a cultura).
Não sendo essa a situação, o país vive do «amor à camisola» de meia dúzia de autores e meia dúzia de editores que, com muito esforço e dedicação, tentam deixar aos outros um pouco do seu conhecimento. Estou a lembrar-me de casos como os de Carlos Fiolhais na física, Desidério Murcho na filosofia ou Jorge Buescu na matemática. Estas considerações vem a propósito do último livro deste último. O Fim do Mundo está Próximo? (Gradiva, 2007) é mais um livro que faz respeitar a matemática, mesmo a um leigo como eu, revelando o seu carácter denso e mais criativo. Como refere o autor no aperitivo ao livro:
“Um livro sobre ciência pode ser sério sem ter de ser aborrecido. E sobre a mais rigorosa das ciências, a matemática, pode ser muito sério e simultaneamente muito divertido, começando pelo título”. (p.10).
E é isso que, à semelhança dos seus dois títulos anteriores publicados em português, O Mistério do Bilhete de identidade e outras histórias(10ª ed., 2005) e Da falsificação de euros aos pequenos mundos(3ª Ed. 2005) (ambos da Gradiva), Jorge Buescu consegue fazer, a saber, ensinar, ao leitor, matemática, de forma muito divertida, que pode ir de compreendermos porque é que o Sudoku não exige qualquer conhecimento matemático, até ao caso do chuveiro assombrado.
Vale a pena descobrir este autor e, sobretudo, descobrir a matemática com este autor. Compreendemos por fim porque é que a matemática é profundamente criativa e não aquela chatice puramente formal que muitas vezes aprendemos na escola. Acima de tudo vale a pena descobrir porque é que a matemática, em primeiro lugar, relaciona e lida com ideias.
Jorge Buescu, O fim do mundo está próximo?, Gradiva, 2007
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Blog de divulgação da filosofia e do seu ensino no sistema de ensino português. O blog pretende constituir uma pequena introdução à filosofia e aos seus problemas, divulgando livros e iniciativas relacionadas com a filosofia e recorrendo a uma linguagem pouco técnica, simples e despretensiosa mas rigorosa.