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A Filosofia no Ensino Secundário

Novidades editoriais de interesse para estudantes e professores de Filosofia.

A Filosofia no Ensino Secundário

Novidades editoriais de interesse para estudantes e professores de Filosofia.

O fácil no ensino da filosofia

Uma das queixas habituais da parte dos professores de filosofia em relação aos manuais é a de que determinados manuais até são bons para o professor pesquisar, mas não para o aluno estudar, uma vez que não é um manual fácil. Este argumento incorre em falsidades que pretendo aqui esclarecer.
1º Os manuais escolares não são bibliografia do professor, mas bibliografia do aluno. Coitado do professor que prepara as suas aulas e apura a sua formação filosófica, com base em manuais escolares. Além disso, se um professor confia num manual, cientificamente rigoroso, para preparar as suas aulas, porque não confia nele para os seus estudantes estudarem? Isto não faz sentido. O professor que assim julga está profundamente errado, até porque manifesta a sua desconfiança em relação às capacidades cognitivas do aluno, remetendo-o muitas vezes para um manual que diz e aborda banalidades pensando que essa é a melhor forma de o ajudar. Como é que professores responsáveis preocupados com a qualidade do ensino e o insucesso escolar compactuam com esta mediocridade? E isto é duplamente falso. O aluno deixa de ver interesse na disciplina uma vez que ela não passa de uma série de banalidades com palavreado mais complicado do que aquele que se usa no dia a dia. O professor que compactua com esta situação, concorre directamente para que a sua disciplina deixe de fazer sentido no quadro do ensino secundário como formação geral. Cabe ao professor a responsabilidade de lutar contra esta dura realidade. E combate-a eficazmente se começar por exibir os conteúdos próprios e científicos da disciplina e não fazendo dela, como muitas vezes se ouve falar, «senso comum esclarecido». Qual é o Ministério da Educação que despende uma grossa fatia do seu orçamento para pagar a professores que ensinam «senso comum esclarecido»? É isto que muitos professores de filosofia pretendem para os seus próprios filhos?
2º Um manual que só diz banalidades (como a maior parte), fugindo aos métodos e conteúdos próprios da filosofia, falando de generalidades recorrendo a textos não filosóficos, não torna o estudo mais fácil para o aluno. Regra geral, este tipo de manuais incorrem nos mais variados erros e confundem o aluno não lhe apresentando os conteúdos centrais de forma rigorosa e coerente, mas antes uma manta de retalhos desconexos e confusos. Há manuais que chegam a disparates como afirmar que, perante um jogo de futebol, cabe ao filósofo perguntar, «o que é um jogo?) (Introdução…, Texto Editores, p.32). Não conheço na extensa bibliografia filosófica um só filósofo que tenha questionado tal coisa. E não há razão alguma para cometer este tipo de disparates, a não ser pela hipocrisia intelectual e profissional de pensar que assim o estudante se interessa mais pela disciplina.
Existe ainda uma outra razão intelectualmente desonesta para se tomar a opção por um manual falsamente fácil para o aluno. E essa prende-se com a ideia de que o aluno não é capaz de mais e que é muito difícil estimular o aluno para o estudo. . É falso que o aluno não seja capaz de mais, mas até é verdade que é tarefa complexa estimular o aluno para o conhecimento e discussão crítica dos problemas da filosofia. Mas não é para estimular o aluno ao conhecimento e à reflexão crítica que recebemos um vencimento ao final do mês como professores de filosofia? E se não cumprimos minimamente com este objectivo que sentido faz continuar a pagar-nos?
Finalmente, a ideia que um manual cientificamente rigoroso é difícil não passa de outra falsidade. É precisamente o rigor científico que abre caminho à clareza e inteligibilidade e não o contrário. Pensar que um manual que diz uma série de banalidades ao modo do «eduquês» facilita a vida do estudante é uma falsidade. E esta ideia está generalizada, mais gravemente ainda quando se trata de professores de filosofia cuja tarefa é crítica e não a mera aceitação passiva de imposições ideológicas. Revela irresponsabilidade para com a própria disciplina. Aceitar este estado de coisas é embarcar ingenuamente na política do «eduquês», principalmente quando nos são oferecidas de bandeja alternativas melhores. Curiosamente os argumentos que o «eduquês» tem a seu favor são o insucesso escolar, o facilitismo que todos os professores não desejam, alunos mal preparados e o desinteresse generalizado dos estudantes. E os filósofos nada fazem para contrariar esta tendência para além de um suave lamento em reuniões de conselho de turma, para, logo na oportunidade imediata, aceitarem acriticamente a cultura e ideologia do facilitismo na educação. A ideia final é que aquilo que se pensa ser facilitismo, não o é, corroendo o valor fundamental da educação que é formar cidadãos livres e responsáveis.
Ainda uma outra observação final. Parece claro o argumento que um manual pode ser cientificamente rigoroso e mau didacticamente. Não é, com efeito, o caso dos manuais que faço referência no topo da lista de manuais de filosofia do 10º ano que publiquei neste blog.
 
Rolando Almeida

Boa atitude para a filosofia

Mas lembro também aos meus colegas que nós, filósofos profissionais, temos o dever de nos explicarmos, bem como às nossas investigações e às tradições de pensamento das quais partimos e às quais reagimos; e que uma forma de o fazermos é envolvendo-nos em conversação com não-especialistas acerca das grandes figuras da nossa tradição. Descartes é uma das maiores. Assim, tentar fazer dele mais que um nome na capa de um livro ou uma referência numa lista de leituras é tentar demonstrar que a aventura do pensamento é uma coisa viva, importante e consequente, e que ele e nós – e, na verdade, todos aqueles que lêem e pensam, incluindo os leitores para quem este livro foi escrito – também estamos envolvidos nessa aventura.
 
A C Grayling, Descartes, Europa America, Col. Grandes Biografias, 2007, Trad. Manuel Leite,p.14 - Do Prefácio

A Filosofia Moral de Mill

A ética normativa é a parte da ética que estuda como devemos agir, ou que tipo de pessoa devemos ser. No âmbito da ética normativa, Mill é um consequencialista. O consequencialismo é uma teoria composta por duas partes: uma teoria do bom e uma teoria do correcto. A primeira trata de determinar que estados de coisas são bons, fornecendo também, geralmente, critérios para os comparar – critérios que determinam qual o melhor estado de coisas entre vários. A teoria do correcto trata de determinar o que devemos fazer. De acordo com o consequencialismo, o correcto consiste em maximizar o bom, ou seja, consiste em gerar o melhor estado de coisas possível, se esse estado de coisas ainda não existe, ou em preservá-lo se já existe.
O consequencialismo, tal como formulado, pode parecer uma posição inócua e trivial, mas não o é. Há teorias normativas, «não consequencialistas», que defendem uma relação diferente entre a teoria do bom e a teoria do correcto. Uma teoria não consequencialista típica começa por especificar uma teoria do bom, mas nega, de seguida, que o correcto consista sempre em maximizar o bom.
O seguinte exemplo ilustra a diferença entre o consequencialismo e o não consequencialismo. Suponhamos que um consequencialista e um não consequencialista têm a mesma teoria do bom. De acordo com essa teoria do bom, um estado de coisas em que dez pessoas são mortas é melhor em que um estado de coisas em que duas pessoas são mortas. O consequencialista e o não consequencialista deparam-se agora com uma situação em que a única maneira de evitar que dez pessoas morram é matar duas pessoas. O consequencialista dirá: se tivermos de escolher entre esses dois estados de coisas, então, dado que o correcto consiste em maximizar o bom, o correcto será matar essas duas pessoas. O não consequencialista, como não acredita que o correcto consista sempre em maximizar o bom, pode dizer que o correcto não consiste, nesse caso, em matar as duas pessoas, mas sim em deixar as outras dez morrer.
 
Pedro Madeira, in. Prefácio de John Stuart Mill, Utilitarismo, Gradiva, 2005

A moralidade dos animais não humanos

Uma vez que tanto os seres humanos como os não humanos podem sofrer, temos iguais razões para não maltratar qualquer deles. Se um ser humano é torturado, porque razão é isso errado? Porque ele sofre. Por analogia, se um ser não humano é torturado, também sofre, e por isso é igualmente errado e pela mesma razão. Para Bentham e Mill, esta linha de raciocínio era decisiva. Humanos e não humanos têm igual direito à consideração moral.
     No entanto, esta perspectiva pode parecer tão extrema, na direcção oposta, como a perspectiva tradicional que não concede aos animais qualquer lugar independente no plano da moralidade. Devem os animais ser de facto encarados como iguais aos seres humanos? Em alguns aspectos, Bentham e Mill pensavam que sim, mas tiveram o cuidado de sublinhar que isso não significava que animais e humanos tenham de ser sempre tratados da mesma maneira. Há diferenças factuais entre eles que com frequência justificam diferenças de tratamento. Por exemplo, uma vez que os seres humanos têm capacidades intelectuais que faltam aos animais, são capazes de sentir prazer em coisas que os seres não humanos são incapazes de fruir – os seres humanos podem fazer matemática, apreciar literatura,e assim por diante. De modo análogo, as suas capacidades superiores podem torná-los capazes de frustrações e desapontamentos de que os outros animais não podem ter experiência. Por isso, o nosso dever de promover a felicidade implica o dever de promover esses prazeres especiais para eles, bem como de prevenir qualquer tipo de infelicidade à qual são vulneráveis. Ao mesmo tempo, no entanto, na medida em que o bem estar dos outros animais é afectado pela nossa conduta, temos o dever moral estrito de tomar isso em conta, contando o seu sofrimento de modo igual ao de um sofrimento semelhante de que um ser humano tenha experiência.
     Os utilitaristas contemporâneos têm por vezes resistido a este aspecto da doutrina clássica, e isso não é surpreendente. O nosso «direito» de matar, fazer experiências ou usar os animais de outras formas que queiramos parece à maioria de nós tão óbvio que é difícil acreditar que estamos realmente a comportar-nos tão mal como Bentham e Mill insinuaram. No entanto, alguns utilitaristas contemporâneos avançaram argumentos poderosos para mostrar que Bentham e Mill tinham razão. O filósofo Peter Singer, num livro com o estranho título de Libertação Animal *(1975), insistiu, seguindo os princípios estabelecidos por Bentham e Mill, que o nosso tratamento dos animais não humanos é profundamente incorrecto.
 
James Rachels, Elementos de Filosofia Moral, Gradiva, 2005, pp.145-146

O sentido da vida, de Desidério Murcho

Por vezes interrogamo-nos sobre o "sentido de tudo isto". Que sentido tem a vida, se é que tem algum? Vivemos, trabalhamos, amamos, criamos e depois morremos. Poderá tudo isto ter sentido? Poderá uma vida além da morte, no paraíso, dar sentido à vida? Esta conferência propõe uma viagem breve por algumas ideias filosóficas influentes sobre o sentido da vida, numa linguagem clara e despretensiosa. Dia 26 de Maio de 2007, às 17:00 horas, no auditório da FNAC, Madeira Shopping, S. Martinho (Funchal).

Manuais 2007 - Análise e classificação

A seguir publica-se uma breve análise aos manuais de filosofia para o 10º ano, em 2007. A escolha e preferências procura ser imparcial e obedecer a critérios o mais objectivos possível, entre os quais:
- Adequação didáctica.
- Rigor científico.
- Aspecto gráfico.
- Clareza de linguagem.
- Outros aspectos, como preço e materiais adicionais.
No final apresentamos uma grelha comparativa de todos os manuais chegados das editoras. Os manuais são apresentados pela ordem da nossa preferência e são classificados de uma estrela a cinco estrelas.
Excelente
*****
Muito Bom
****
No Bom caminho
***
Mau
**
Inaceitável
*
 
Consideramos que um bom manual é aquele que apresenta directamente os problemas da filosofia numa linguagem clara e didacticamente correcta, além de reflectir um bom conhecimento, por parte dos autores, da bibliografia actual. Claro está que não existem manuais perfeitos nem é disso que se trata. Acontece que alguns manuais são manifestamente maus, outros razoáveis e outros ainda com a qualidade desejável. Qualquer comentário será bem-vindo, alertando até para um ou outro ponto que a nossa apreciação possa omitir, evitando criar injustiças na apreciação feita. Desejamos que este pequeno trabalho incentive alguma discussão crítica em relação ao trabalho desenvolvido na nossa disciplina. Procuramos não ser evasivos nem usar critérios pessoais, mas estamos certos que qualquer apreciação comete as suas falhas. A nossa também, por certo, as comete. Apoiamo-nos na grelha que apresentamos para ter uma visão comparativa de alguns elementos de forma mais rigorosa e objectiva. Esperamos que este pequeno trabalho possa ser útil.
 
Arte de Pensar, Aires Almeida, Célia Teixeira, Desidério Murcho, Paula Mateus e Pedro Galvão, Didáctica Editora
Classificação: *****
Esta é claramente a nossa primeira escolha. Em continuação da edição de 2003, este é um manual que apresenta os problemas da filosofia numa linguagem muito cuidada a pensar nos alunos do secundário. Além disso, mantém a coerência interna até à última unidade e todos os conhecimentos aprendidos na primeira unidade vão sendo aplicados ao longo das seguintes. Graficamente também bate os outros manuais. É muito sóbrio, com esquemas e sínteses muito intuitivas, longe da confusão de outros manuais. A bibliografia é correctamente citada, não esquecendo o nome dos tradutores e o ano de edição. Além do rigor didáctico, o Arte ainda consegue outra proeza: o caderno do professor é verdadeiramente útil para o professor, com soluções de todos os exercícios, planificações aula a aula e ainda testes sumativos com as respectivas soluções de resposta. O Arte tem um site de apoio com muitos textos disponíveis, grande parte deles traduzidos pelos próprios autores como acontece no corpo do próprio manual. Tem ainda um fórum de apoio on-line permanente aos professores ao longo de todo o ano lectivo. Se pensarmos que um manual é feito para os alunos estudarem, o Arte é sem dúvida alguma a escolha certa. Apesar de outros manuais se aproximarem do Arte, ainda nenhum alcançou o seu nível de qualidade. Pela oferta observada neste pequeno estudo, alguns manuais parecem felizmente inspirados nas propostas do Arte, não decorrendo qualquer defeito daqui, porque nenhum é uma imitação.  Esta apreciação é sumária e não exaustiva, pelo que muitos aspectos vão ficar por referir. Com efeito, queríamos ainda destacar o modelo apresentado no Arte como um dos modelos mais estimulantes de apresentar a filosofia aos jovens alunos: problema – teoria – objecção. O caderno do aluno é oferta da editora. O Arte é o melhor manual não só no profissionalismo exibido, mas até no preço (o mais baixo de todos, se contarmos que o caderno do aluno é oferecido). Há outros manuais mais baratos, mas o aluno tem de pagar o caderno de actividades o que o torna mais caro que o Arte. Além disso, o Arte tem dois volumes o que implica um custo maior para a editora.
 
Criticamente, Artur Polónio, Faustino Vaz, Pedro Madeira, Porto Editora
Classificação: ****
Estamos perante uma agradável surpresa. Este não é seguramente um manual do «eduquês», mas antes um manual inspirado na filosofia e nos seus problemas. Por comparação não consegue ainda a frescura de linguagem do Arte de Pensar, mas tendo em conta que os autores são estreantes, certamente que uma segunda edição irá superar todas as expectativas. O grafismo do manual parece-nos algo discutível, apesar de consideramos agradável. De todo o modo, como acontece no Arte, as imagens não são colocadas ao acaso, mas com um sentido certo, o que revela a preocupação dos autores em apresentarem um trabalho consistente. Quem ganha com este profissionalismo dos autores são os alunos que começam a perceber que as coisas têm de obedecer a uma ordem e rigor. O Guia do Professor é desnecessário, mas pode ser compensado pelo Manual Electrónico só acessível às escolas que adoptarem futuramente o manual. O Criticamente é a prova que se podem fazer bons manuais que apresentem os problemas filosóficos de forma clara. Não leva as cinco estrelas porque acreditamos que este é um manual pelo qual o aluno precisa ainda muito da orientação do professor para por ele estudar, ao contrário do Arte que garante muito mais autonomia no estudo pessoal do aluno. Apesar de apresentar as questões de revisão, o manual poderia ter sido enriquecido com pequenos esquemas que funcionassem como sínteses das explicações. Estamos perante um manual sério que não deixa ficar mal vista a disciplina e qualquer professor se poderá orgulhar de ensinar filosofia com esta boa ferramenta.
 
Filosofia, Luís Rodrigues, Plátano Editora
Classificação: ****
Na verdade o manual de Luís Rodrigues está empatado com o Criticamente resultando, tal como o anterior, numa escolha acertada para o professor que com ele pretenda desenvolver o seu trabalho. Tal como o Arte, são dois volumes, o que torna até o transporte mais fácil. E, tal como o Arte, o caderno do aluno também é oferecido (mas é mais caro que o Arte). O manual está muito bem conseguido, mas curiosamente o 2º volume parece estar uns palmos abaixo do 1º, não se percebendo muito bem como tal aconteceu. Mas já lá vamos! Nota-se um cuidado primoroso da editora pela qualidade gráfica do manual, mas as imagens escolhidas não têm grande qualidade, o que não combina bem com o próprio grafismo. Apostou-se demasiado nas imagens de capas de livros, e temos dúvidas das vantagens significativas dessa opção num manual escolar. Mas o autor revela um bom conhecimento bibliográfico e posições coerentes sobre o modo de trabalhar um programa de filosofia. A filosofia é novamente apresentada como um conjunto de problemas e teorias que podem ser objectáveis e refutadas. O que acontece no volume 2 (Dimensão Religiosa, Dimensão Estética e Temas e Problemas) é que as matérias aparecem umas atrás das outras sem a exploração mais aprofundada das unidades do primeiro volume. Na unidade final é apresenta somente um tema. O professor fica limitado ao tema do manual não podendo optar por outro, quando há manuais que apresentam mais que um tema como opção. É ainda discutível a capacidade problematizadora da unidade da Estética para o aluno. Ainda assim, estamos perante uma segunda opção, ao lado do Criticamente, que mostra a filosofia e os seus problemas tal qual ela e eles são. Sem dúvida alguma que resulta numa óptima escolha.
 
 Logos, António Lopes e Paulo Ruas, Santillana- Constância
Classificação: ****
O Logos é ainda uma das melhores opções que nos chegaram às mãos, ainda que não respire o fulgor da clareza da nossa primeira opção, o Arte. Tem ainda alguns pontos a desfavor que o colocam abaixo das 3 primeiras escolhas. É mais caro. Não se compreende a razão de o livro do professor ter autores diferentes dos do manual o que resulta numa orientação diferente da opção no corpo do manual. Globalmente não encontramos erros óbvios. Com um grafismo muito bem cuidado, é um manual que cumpre com um bom ensino da filosofia, mas o aluno necessita de ser estimulado pelo professor para começar a ler e estudar por este livro. Tem a tendência a apresentar os problemas de forma algo mais dogmática que os manuais anteriormente referidos. Muitas das vezes este problema pode ser contornado nos exercícios propostos aos alunos no final de cada unidade. No final, os autores apresentam uma síntese cronológica da história da filosofia. Dada a riqueza da filosofia contemporânea é manifestamente incompleta a cronologia apresentada. Há ainda uma opção muito discutível na concepção deste manual. Os autores abusaram de textos de introduções à filosofia, como a de Nigel Warburton, quando deveriam ter usado directamente os textos dos filósofos. O que o Warburton fez é o que qualquer autor de um manual deve fazer. Não faz sentido um autor de um manual usar textos de outro autor de um manual para expor um problema de Kant ou Mill quando temos os textos de Kant ou Mill que são riquíssimos.
 
 Contextos, Marta Paiva, Orlanda Tavares, José Ferreira Borges, Porto Editora
Classificação - ***
O Contextos foi apresentado pela editora como um manual em que os autores se empenharam por investigar as tendências dos jovens e os seus gostos e referências. Percebe-se logo que estamos perante um manual que se cose com as linhas do «eduquês». Logo no início é proposta a letra de uma canção de Boss Ac para responder a um questionário. A ideia é agarrar o aluno para a filosofia partindo das suas referências. Conversa fiada!
Ainda na primeira unidade o manual apresenta distinções desnecessárias, como entre filosofia sistemática e espontânea, entre dimensão prática e teórica. Os lugares-comuns também aparecem, tal como as características da filosofia. Claro está que a filosofia, como qualquer saber tem os seus lugares-comuns. Por lugares-comuns entendemos aqueles que aparecem normalmente nos manuais de filosofia, mesmo estando errados. Quando um autor opta pela exposição das características da filosofia está a roubar lugar à filosofia enquanto actividade crítica. Que faz um professor e os alunos com as características da filosofia? O valor da exposição deste tipo de temas é tanto como se estivéssemos a dizer que os filósofos gregos gostavam de mais de roupas azuis e amarelas, ao passo que os medievais já apreciavam muito o vermelho. Mais tarde isto só irá servir para colocar ao aluno uma questão que lhe pede tudo menos capacidade crítica de análise de um problema. A filosofia do Contextos é apresentada ao aluno como:
 «um esforço de defesa de ideias e de clarificação de conceitos» (p.40).
A filosofia não é, deste modo, apresentada como aquilo que ela é, uma discussão crítica de razões que se oferecem para defesa de uma tese. É um erro muito comum nos manuais – e o Contextos não escapa a esse erro – dizer aquilo que a filosofia é, sem mostrar como e porquê ela é assim. Assim, diz-se que a filosofia é a clarificação de conceitos mas não se mostra como se clarifica conceitos. E isto acaba por resultar como uma receita que, normalmente, o aluno decora para escrever num teste, mas não é estimulado a pensar. Na análise da dimensão religiosa, quase toda a unidade é ocupada com temas como «a dimensão social da religião», mas evitando o problema da existência de deus que ocupa somente uma pequena parte da unidade. Dá a ideia que a filosofia da religião é estudo híbrido entre a história e a sociologia e os filósofos pouco ou nada têm a dizer sobre o assunto. Ignora-se sem dó nem piedade os textos dos filósofos e os problemas da filosofia.
Graficamente é um manual muito ao estilo do «eduquês», com imagens que na maior parte das vezes não têm qualquer relação com o que se está a explicar. O manual apresenta ainda uma barra lateral com indicações para o professor. Mas essa opção torna o manual mais confuso e pesado. Seria um dos manuais mais baratos (diferença de 10 cêntimos) caso o caderno do aluno fosse oferecido. Sendo pago, o manual acaba por ter um preço mais elevado que outros manuais.
 
 
 
Percursos, Carlos Amorim, Catarina Pires, Areal Editora
Classificação: ***
Este é um manual de transição. Uma boa parte da desvalorização dos manuais classificados a partir do Percursos, nesta nossa lista, perde por não apresentar a filosofia como uma actividade de discussão racional, transformando-a numa espécie de receita que pouco estimula o aluno. Essa tendência observa-se quando os autores, no lugar dos textos dos filósofos ou dos problemas filosóficos, optam por colocar textos sociológicos ou rematar os problemas como se estes tivessem uma solução pronta a oferecer. Isto é, na verdade, o que os alunos querem. Precisam e desejam respostas, mas a filosofia aparece como disciplina de formação geral precisamente para mostrar que as coisas não são bem assim. Mas para tal é necessário abrir a discussão filosófica e não fechá-la, banalizando-a, ou passando a ideia que os problemas estão resolvidos, como acontece com os manuais que aqui classificamos nas últimas posições. O Percursos apresenta assim ao estudante a filosofia:
«as questões filosóficas são as questões primeiras e essenciais que todos um dia colocamos, e demonstram uma curiosidade que com o tempo tendemos a perder. Porque perdemos essa curiosidade? Porque nos afastámos desse mistério? Pela dificuldade das respostas? Não, o problema não é a dificuldade das respostas; o que se passou é que ficámos presos a um conjunto de respostas sobre o eu, sobre o conhecimento e sobre a realidade, que demos como garantido pela segurança que nos transmitem. No fundo, mais do que conhecimentos, adquirimos crenças. Com isto criamos uma realidade estável, fixa e imóvel que não existe de facto. Nesta medida podemos dizer que possuímos conhecimento mas não possuímos sabedoria. Sócrates identificou precisamente este problema que é o principal obstáculo à filosofia – pensar que já se sabe tudo» (p. 18-19).
Este tipo de afirmações logo no início do manual só baralha o aluno. Primeiro que tudo a distinção entre conhecimento e sabedoria não nos parece correcta. Segundo, fala-se em crença sem explicar o que se quer dizer com isso. O que acontece é que a generalidade dos filósofos defende que o conhecimento é crença verdadeira justificada (sendo depois muito difícil caracterizar o tipo correcto de justificação) e daí a necessidade de argumentação racional e filosófica para justificação das nossas crenças. Mas tal problema nem deve ser colocado nesta unidade inicial. Na barra lateral os autores sugerem ao professor que faça a distinção entre conhecimento e crença. Mas o que pretendem os autores exactamente com isso? É que o conhecimento não se distingue da crença, começa com ela. A crença é uma condição necessária ao conhecimento, apesar de ainda insuficiente. Pegando noutro exemplo, relativamente aos valores, os autores definem objectivismo axiológico do seguinte modo:
«para o objectivismo axiológico, os valores existem em si mesmos. São independentes dos sujeitos que os preferem ou desejam. São objectivos e absolutos. Não variam em função das flutuações dos nossos estados psíquicos ou das transformações histórico culturais. São intemporais e universais. Ainda que todos nós fossemos injustos a Justiça continuaria a ser, em si mesma, um valor» (p. 67).
Esta é uma definição comum, mas errada. Então donde vêm os valores, do ponto de vista objectivista? Os autores apresentam a definição como receita, não estimulando o aluno a pensar sobre o problema. Por outro lado, defende-se a objectividade dos valores como uma possibilidade racional, como Kant o sugeriu. Estamos perante um manual que tem a intenção positiva de agarrar a filosofia pelos problemas, mas que ainda é manifestamente insuficiente no modo como o faz. Na Estética, por exemplo, os autores exploram somente a teoria da forma significante em parcas linhas nem sequer abordando as outras teorias em disputa. Em conclusão, é um manual insuficiente, por vezes muito confuso e que não passa das intenções. Graficamente é um manual ainda muito confuso recorrendo aos lugares-comuns da banda desenhada do Calvin & Hobbes e diversos cartoons.  As 3 estrelas valem pela intenção.

Manuais - análise

Pensar é Preciso, Adília Maia Gaspar, Lisboa Editora
Classificação: **
Adília Gaspar apresenta o objecto da filosofia deste modo: «podemos começar por dizer que a filosofia não tem um objecto específico de estudo, tem vários, ou, se se quiser, o seu objecto é o Todo. Isto é, tudo quanto existe, o que quer que seja, pode tornar-se objecto de reflexão filosófica, dependendo apenas da perspectiva em que é encarado e dos processos utilizados para o abordar. É nesse sentido que se diz que o objecto da reflexão filosófica é o Ser, conceito que engloba tudo quanto existe, desde os mais simples e vulgares objectos materiais até às mais complexas e refinadas criações do espírito humano. A arte, a religião, o comportamento do ser humano e os valores por que se orienta, a própria ciência, a linguagem, o domínio da acção política, são campos que a filosofia explora» (p. 9). Quando um aluno ao iniciar o estudo da filosofia se confrontar com uma definição desta natureza, o que ficará a pensar da filosofia? Cremos que o mais provável será mesmo fechar o manual e não voltar a abrir coisa tão aborrecida. Na verdade esta é uma ideia confusa e errada do que seja o objecto da filosofia. Claro está que o objecto da filosofia é a realidade. Mas será toda a realidade? Será objecto da filosofia saber como se desenvolve um cancro? Ou será objecto da filosofia saber se amanhã vai ou não chover? Ou quantos anos vai durar a torradeira nova? Que vantagem tem dar este tipo de explicação aos alunos? Mais adiante, a autora define Epistemologia do seguinte modo: «a reflexão, não já sobre o conhecimento em geral, mas mais especificamente sobre o conhecimento científico é o objecto da epistemologia; em grego, episteme, significa conhecimento científico (…)» (p. 24) Este é um erro elementar que infelizmente aparece com frequência nos manuais. A epistemologia trata da natureza do conhecimento em geral, distinguindo-se da filosofia da ciência que trata especificamente do conhecimento científico. Nem todas as questões sobre a natureza do conhecimento são questões científicas. Uma das limitações, também infelizmente habitual nos manuais de filosofia, é não apresentar as objecções às teorias limitando-se a exposição dogmática das mesmas. As teorias são banalizadas fazendo com que o manual se assemelhe a um caderno de apontamentos. O manual impõe uma ideia de que pensar é preciso sem mostrar como é que precisamos de pensar. Uma má opção.
 
 Pensar Azul, Fátima Alves, José Arêdes, José carvalho, Texto Editores
Classificação: **
Pensar Azul é mais um exemplo de um manual híbrido entre a tentativa de apresentar a filosofia como uma actividade de discussão racional de problemas e argumentos e uma ideia de que a filosofia trata de tudo e de todos «sem rei nem rock». Quando assim é, os erros aparecem. Por exemplo,  os autores elaboram a questão:
«em que se distingue a filosofia das outras ciências?» (p. 36).
Mas onde foram os autores buscar tal ideia? A filosofia é, agora, uma ciência? Com que base podemos afirmar tal coisa? Mas o manual segue com confusões que em nada beneficiam o gosto de aprender filosofia. Por exemplo, na unidade da Dimensão Religiosa, os autores começam por expor os argumentos sobre a existência de Deus. Expõem o argumento cosmológico, o argumento do desígnio e, depois, surge a “Posição de Kant sobre a existência de Deus” (p. 249). Não se entende se Kant tem ou não argumentos sobre a existência de Deus. E também não se perceber porque é que antes se falou em argumentos (mesmo que a opção dos autores seja a de não explorar todos os argumentos, como o ontológico, por exemplo) para logo a seguir se falar em posição em vez de argumento. Esta mistura de vocabulário cria confusões desnecessárias. Também não se entende a opção de apresentar determinadas unidades como problemas, teorias e objecções, se o método proposto na unidade inicial vai além dos problemas e objecções. Se não se ensina ao aluno algo tão básico como negar proposições, qual o sentido de lhe pedir, mais tarde, que objecte a certos argumentos? Quando, num manual, optamos por mostrar as objecções a uma determinada teoria, é para mostrar ao aluno como ele próprio pode objectar. Mas para que o aluno o chegue a fazer, é necessário dotá-lo da ferramenta que é a lógica. Se não fizermos isto, então das duas uma: ou vamos pedir ao aluno que faça aquilo que não lhe ensinámos a fazer ou, caso contrário, somente expomos objecções para o aluno decorar e repetir acriticamente. O Pensar Azul comete esta falha, o que faz dele uma má opção para ensinar filosofia. Pode tratar-se de um manual engraçado para informar o aluno sobre alguns aspectos da filosofia, mesmo cometendo erros e incoerências, mas é um mau manual para ajudar o aluno a desenvolver as suas competências críticas. Por exemplo, um lugar-comum nos manuais é o recurso às famosas características da filosofia: universalidade, radicalidade, historicidade e autonomia. Em que é que esta informação contribui para desenvolver o espírito crítico do aluno? Não será melhor expor os instrumentos para pensar e entrar directamente no conhecimento dos problemas, nas suas teorias e consequente discussão? Os autores do Pensar Azul têm opções muito discutíveis como, entre outras, afirmar que Stuart Mill propôs a felicidade global. Até se percebe a intenção dos autores, mas, em rigor, Mill não falou de tal coisa. Existe, em Pensar Azul, uma tentativa clara de aproximação à filosofia como actividade crítica, mas ainda falta apurar o manual. E isso consegue-se abandonando, sem reservas, alguns clichés habituais na concepção de manuais de filosofia e que não merecem mais a insistência dos autores porque foram esses clichés que transformaram a filosofia numa disciplina muitas das vezes aborrecida para os alunos. Um desses clichés presente no Pensar Azul é a infrutífera distinção entre ética e moral que não produz qualquer efeito para o desenvolvimento do pensamento crítico dos alunos. Sobre a questão dos Valores e Cultura, o Pensar Azul é completamente acrítico e mais se assemelha a um manual de sociologia. Não expõe o problema do relativismo cultural, nem o trata filosoficamente. Fica-se com a ideia que se deu ali uma qualquer informação sobre o assunto e nem sequer se percebe se se trata ou não de um problema da filosofia. Os alunos merecem mais e podem pensar com a cor que quiserem, mas com o rigor que a filosofia possui. Graficamente, o manual é de um gosto muito discutível, com imagens por vezes a roçar o piroso. Os esquemas-sínteses são pouco claros e podem conduzir à dispersão. De referir que os autores abusaram de textos que retiraram de sites, muitas vezes em português do Brasil. Não se vê particular vantagem nesta opção se podemos recorrer aos textos dos filósofos, onde os problemas são expostos. O manual é pouco rigoroso e dá uma ideia muito vulgar da filosofia. Explora problemas sem citar um único texto dos filósofos, a menos que exista tradução portuguesa de recurso.
 
 Um Outro Olhar Sobre o Mundo, Maria Antónia Abrunhosa e Miguel Leitão
Classificação: *
O manual de filosofia da Asa é uma opção errada a todos os níveis, desde o grafismo ao preço. Mas vamos ao conteúdo, ainda que em linhas muito breves. Folheando o manual da Asa dificilmente percebemos que estamos perante um manual de filosofia. Mais parece um qualquer livro confuso com informações avulso do que propriamente um manual. É escusado tecer aqui qualquer comentário elaborado sobre os esquemas-síntese, que mais parecem um novelo de fio completamente enrodilhado, sem modo de desfazer tanto enrodilho. Se um esquema serve para simplificar, com que intenção se apresentam esquemas que ainda confundem mais? Depois há uma série de opções que, talvez ao pretenderem a diferença, mergulharam no universo do fútil e do disparate. Vamos começar pelo fim. O manual não dá o direito de opção dos temas e problemas da filosofia. Os autores reduziram a escolha à imposição do tema “os direitos das mulheres como direitos humanos”. Basta folhear o manual para fazer logo uma pergunta: como é possível tratar um tema inteiro não abordando um único texto de filosofia ou de um filósofo? Ainda por cima, saiu em tradução portuguesa recentemente o livro de Stuart Mill, A Sujeição das Mulheres (Almedina, 2006). Temos razões de sobra para afirmar que não estamos perante um manual de filosofia. Qualquer jornalista faria melhor. Que interesse filosófico tem explorar um problema ignorando pura e simplesmente os textos dos filósofos? É uma opção desastrosa que em nada dignifica a filosofia. Mas há mais, infelizmente! Logo no início do manual, os autores apresentam a metodologia do pensamento crítico. Logo aqui deveriam apresentar a metodologia do pensamento filosófico, até porque há pensamento crítico que não é necessariamente filosófico. Referindo-se à lógica, os autores citam outros:
«quando pensamos, lidamos com uma série de conceitos que se combinam uns com os outros. Se os conceitos se coordenam entre si e fazem sentido, o pensamento é lógico. Se não se apoiam uns nos outros, se se contradizem e não fazem sentido, então não há lógica nenhuma.» (p. 9).
Daqui não se retira ideia alguma a não ser uma ideia completamente absurda do que é a lógica. A lógica não é uma relação entre conceitos, mas sim uma relação entre proposições. Repare-se a confusão:
«todavia, nem todas as proposições são argumentos. Uma proposição isolada não é um argumento. Só o é se, de facto, se relacionar e estiver a apoiar numa tese.» (p. 22)
Dá a ideia falsa de que uma proposição pode ser um argumento, quando sabemos que um argumento é um CONJUNTO de proposições. Isto é como pensar que uma pessoa pode ser uma nação porque um conjunto de pessoas pode ser uma nação. Se na metodologia do pensamento crítico apresentada no início do manual não se fala uma única vez de teses e argumentos, já nos elementos essenciais do discurso argumentativo (p. 37) se aborda a filosofia em termos de tema, tese, corpo argumentativo e conclusão. Nem vou tecer mais qualquer comentário relativamente ao que se diz sobre cada um destes elementos. É que no que vem a seguir não se fala mais nem em problemas, nem em argumentos. Maria Abrunhosa e Miguel Leitão fizeram um trabalho filosoficamente intratável, conseguindo, em 303 páginas, não apresentar um único problema filosófico relevante. Não se trata de um manual minimamente sério, nem de um manual de filosofia e qualquer pessoa com formação que não seja filosófica, perante este manual, é perfeitamente capaz de se questionar que relação tem o livro com a filosofia. O manual é um outro olhar sobre o mundo, mas não é um olhar filosófico de certeza.
 
 
Phi, Agostinho Franklin, Isabel Gomes, Texto
Classificação - *
Mais um manual que dá uma ideia errada e aborrecida do que é a filosofia. Se alguns autores seguem os bons exemplos, outros insistem teimosamente num modelo que já mostrou as suas insuficiências. Repare-se no disparate que um aluno de 15 anos vai ler logo na unidade inicial:
«A Filosofia é, pois, a disciplina onde vamos ter a oportunidade de ganhar consciência sobre as coisas; a filosofia vai permitir reflectir sobre o que já sabemos e, até, ajudar a criar pensamentos, ter ideias e ter consciência de que produzimos essas ideias e opiniões.
Temos então que:
- até ao 9º ano, esperava-se que se soubesse a matéria;
- até ao 9º ano, esperava-se que se tivesse um saber técnico sobre as diferentes matérias.
Agora, com a filosofia, espera-se mais. Espera-se:
- que se comece a pensar sobre essas coisas;
- que se comece a reflectir pessoalmente.
(…)
- começa-se, por isso, a construir uma personalidade própria, (re) analisando o que nos ensinaram na infância, olhando as coisas de outra maneira, encontrando novas soluções para aquilo que agora não está claro e reconhecendo os preconceitos do mundo em que vivemos.» (p. 17)
 
É impressionante como é que um manual pode dizer semelhantes disparates. Parece que agora sim, o aluno vai ser salvo da sua estupidez pela varinha mágica que é a filosofia. No módulo inicial, o manual pura e simplesmente ignora os instrumentos para pensar filosoficamente. Em vez disso, apresenta uma conversa fiada completamente inoperacional para a filosofia. Nem se percebe o que se pretende que o aluno saiba. Dá a ideia que o aluno deve ler e ficar muito sensibilizado para a filosofia! Um disparate que não augura resultados positivos. Colocam-se aqui sérias questões: o que beneficia um manual assim a disciplina? Como avaliar objectivamente os alunos se o que se lhes está a propor não tem nada de objectivo? Os autores nem sequer têm em consideração que estão a escrever um livro para alunos de 15 anos. Mas a ideia é: «a partir de agora estás salvo que tens filosofia» — e repete-se esta tolice das mais variadas formas até que o aluno se convença. Como sabemos, os resultados deste tipo de ensino da filosofia são manifestamente maus, sendo talvez esta a forma de abordagem da disciplina que fez com que a disciplina tivesse perdido praticamente todos os alunos no 12.º ano. O manual propõe exercícios que não passam de tolices, pedindo que se analise letras de canções, filmes, etc. O capítulo da acção humana começa com uma página com recortes de notícias de casos no futebol. Motivo para pensar que o apito dourado também é matéria filosófica. Qualquer pai minimamente sério que pegue neste manual é perfeitamente capaz de se questionar sobre que valor tem esta disciplina para a formação do seu filho. Desde José Mourinho aos Radiohead e Boss Ac, tudo cá cabe... menos a filosofia! É verdadeiramente intratável, este manual. Como é possível, sequer, tecermos aqui um comentário elaborado, se o manual parte de uma concepção de filosofia sem pés nem cabeça? Quem perde com manuais assim é a disciplina de filosofia que se mostra completamente esvaziada dos seus conteúdos. Graficamente, o manual acompanha o conteúdo e mais se assemelha a uma revista da moda. O manual tem um formato diferente da maioria dos manuais. É quadrado. O mais grave é que é também quadrado no conteúdo. Serve-se da ideia da barra lateral com indicações para o professor explorar as aulas, no caso, indicações completamente fúteis. O manual encerra com uma pequena história da filosofia que não consegue, sequer, captar o essencial. Termina com um glossário e nem aí o disparate é evitado. Neste pequeno glossário, que se pensava ser um glossário de filosofia, podemos encontrar palavras como “sub-reptício”, “encarnar” ou “ergonomia”. Já agora, por que não vender um dicionário de sinónimos como anexo ao manual? O phi não passa de Pulp Fiction.
 
 
 
 Filosofia 10, Maria Margarida Moreira, Areal Editores
Classificação - *
Quando lemos o manual Filosofia 10, ficamos com a impressão que o manual foi feito por uma aluna adolescente. Mais parece um conjunto de apontamentos dispersos sem qualquer ligação entre eles e com grandes imagens coladas para os decorar. Há imagens que ocupam uma página inteira. O texto é reduzidíssimo. Numa parte significativa das páginas, o texto mão ocupa mais do que um ou dois parágrafos. Mas vamos ao texto: «O que acabámos de aprender foi a identificar quais os problemas fundamentais que a filosofia coloca e que estes se situam na área da lógica. E isto porque a lógica se ocupa da investigação das regras que tornam o pensamento coerente, não do ponto de vista material, mas do ponto de vista formal.» (p. 20) Este é o omnipresente disparate de confundir validade com verdade, pois a idiotice da validade material é apenas palavreado caro para a verdade. E é também o disparate de pensar que a validade é a mesma coisa que a coerência, ignorando que as falácias são raciocínios perfeitamente coerentes. O resto da página é ocupado com uma imagem enorme (as imagens neste manual não possuem qualquer identificação), para, logo na página seguinte se ler o que a seguir citamos:
«Para já ficámos a saber que a filosofia coloca problemas de ordem lógica (…)» (p. 21).
Mais abaixo, seguindo uma outra imagem sem qualquer referência, pode-se ler:
 «Mas os problemas da filosofia não se restringem ao campo da lógica. Muito pelo contrário: a resolução dos problemas lógicos é fundamental, constitui os alicerces, as bases para a correcta formulação dos outros problemas, que são a essência da filosofia. Queremos com isto dizer que o pensamento filosófico se debruça sobre outras áreas, questiona, analisa, organiza e tenta responder a problemas que levanta.» (p. 21)
Pelo exposto ficamos sem saber se a filosofia é lógica e qual a relação entre a lógica e a filosofia. Ao longo de todo o manual é frequente os problemas nem sequer serem analisados. A ideia de que qualquer um pode fazer um manual dá estes resultados. Este não é apenas um mau manual. É inaceitavelmente mau. A última unidade, Temas e Problemas do Mundo Contemporâneo, nem sequer tem uma linha escrita pela autora. Resume-se a uma série de páginas com textos avulsos sem qualquer interesse filosófico ou outro. Não se compreende sequer como é que uma editora chega a publicar um manual com tão fraca qualidade e seria uma questão de respeito próprio e pela disciplina não apresentar publicamente um trabalho desta natureza. Mas o Filosofia 10 revela o valetudo em que está voltada a concepção de manuais escolares. O manual leva ainda o certificado científico de Álvaro dos Penedos, um professor jubilado da Universidade do Porto, Departamento de Filosofia, o que prova o estado em que a filosofia se encontra no nível superior.
 
 
Introdução… Carlos Sousa, Manuela Amoedo, Texto Editora
Classificação - *
Um aspecto difícil de compreender na concepção de manuais é o seguinte: se temos textos tão ricos em toda a história da filosofia, porque razão se apresenta sistematicamente a filosofia por textos que não são de filósofos? Um manual de filosofia não tem necessariamente de ser inovador e original. Se o for ainda melhor, mas o que exige num manual de filosofia é clareza e exposição dos problemas da filosofia e da filosofia como uma actividade crítica. O Introdução… arrisca-se ao propor explorar os autores portugueses e que escreveram em português. Ora nem que fôssemos alemães, que têm uma tradição em filosofia muito rica, não faria qualquer sentido fazer um manual de filosofia preferindo quase exclusivamente os autores que tivessem escrito em alemão. E tal não faz sentido porque um manual não pode propor-se fazer aquilo que a filosofia séria nunca pode fazer: defender uma qualquer causa com critérios arbitrários. Curiosamente o primeiro texto do manual é de Matthew Lipman, Pimpa e foi escrito para ensinar filosofia a crianças e não a adolescentes. Mas este Introdução… não traz qualquer novidade em relação a outros que aqui temos comentado e cose-se exactamente com as mesmas linhas, cometendo, por essa razão, os erros do costume. Os erros passam em desfile, não muito longe do habitual. No último ponto do programa, onde os autores poderiam livremente propor a exploração de um problema de modo filosófico, trata-se somente um problema sem o direito do professor optar, e remete-se para textos de bispos e padres no lugar dos textos dos filósofos. Isto acontece porque se confunde a filosofia com a antropologia, com a sociologia, o direito, etc. Por vezes chama-se erradamente a isto interdisciplinaridade. O Introdução… em quase todo o manual não introduz o aluno à filosofia e aos seus problemas nem estimula o sentido crítico do aluno. É, portanto, uma péssima opção. Graficamente não se distancia da maioria dos manuais. As imagens não produzem qualquer efeito senão o enfeite.
 
 
 Este Amor pelo Saber, Amândio Foutoura, Mafalda Afonso, A Folha Cultural Editora
Classificação - *
Este Amor pelo Saber é um manual pesado, caro e opta claramente pela linha hermenêutica para ensinar filosofia. O que temos aqui é mais do mesmo. Acriticamente, começa por apresentar ao aluno a filosofia como sendo o Logos, o argumento, a ironia e as ideias. Trata-se de uma lista pronta a ser decorada pelo aluno e repetida até à exaustão num exercício que, na melhor das hipóteses, desenvolve a memória do aluno, mas não a sua capacidade crítica. E é um desfilar de ideias comuns mas que já não se usam na bibliografia mais actualizada da filosofia que se faz hoje em dia, como por exemplo, Gnoseologia como teoria do conhecimento e epistemologia como reflexão sobre o conhecimento científico (p. 42). Se abrirmos o manual no tema dos valores, podemos confundir o manual com um qualquer manual de sociologia, dada a abordagem pouco ou nada filosófica proposta pelos autores. Inacreditavelmente a unidade sobre os temas e problemas do mundo contemporâneo, são 3 páginas (uma delas encerra o livro) com vários contactos e endereços electrónicos de diversas instituições. Nada mais. Nem um texto. Nem uma explicação. Nada. Mais valia apresentar uma lista telefónica como manual de filosofia. Se o aluno quiser saber, que consulte a lista, que contacte as instituições e as pessoas e que pergunte. Esta opção deve resultar da falta de espaço no manual. Mas tal acontece porque os autores ao longo das outras unidades abusaram dos textos sem qualquer interesse. Por exemplo na unidade da acção Humana, no final, aparecem 14 textos, fora os que aparecem na própria exposição. Ora isto conduz à dispersão. Além de tudo trata-se de uma ideia obviamente errada de como se deve fazer um manual. Nem um manual é uma antologia de textos, nem uma lista telefónica.  Este manual está chumbado.
 
 Filosofia, Marcello Fernandes, Nazaré Barros, Lisboa Editora
Classificação - *
Infelizmente para a filosofia e o seu ensino, esta proposta da Lisboa Editora não apresenta nada de novo. As limitações são as mesmas de sempre, os erros os mais comuns. Opta-se pelo recurso a novas traduções que vão saindo no mercado como as de Thomas Nagel e Nigel Warburton. São bons textos e bons autores, mas esses autores o que fizeram foram os seus manuais e para apresentarem os problemas não se citam uns aos outros. Pelo contrário citam os textos dos filósofos.
Podemos encontrar os erros comuns como:
 «a dedução é um raciocínio que conclui um facto particular de uma lei geral, apresentando-se sob a forma “se… então”». (p. 35)
Esta definição de dedução está errada e mais tarde vai conduzir a confusões, nomeadamente no 11º ano. E está duplamente errada. Primeiro, é errado afirmar que a dedução é concluir um facto particular de uma lei geral; e depois a dedução não se apresenta sob a forma da condicional. Fica a pergunta: se não se dominam as noções mais elementares da lógica, como é que se faz um manual de filosofia? Graficamente é um manual muito mau, com os títulos num amarelo que faz doer os olhos para ler. O manual termina de uma forma brusca e nem uma bibliografia possui. Não apresenta um único problema filosófico e não se percebe a opção de colocar indicações do grau de dificuldade dos textos no início dos mesmos. Não produz qualquer resultado. Perfeitamente dispensável.
Rolando Almeida
 

TABELA COMPARATIVA

 
 Nome
Autores
Editora
Preço
Nº Páginas
Caderno de Actividades do aluno
Livro do professor
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Pensar é Preciso
Adília Maia Gaspar
Lisboa
21.50€
256
Não tem
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Colectânea de textos no site da editora
Filosofia 10
Marcello Fernandes/Nazaré Barros
Lisboa
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Filosofia 10
Luís Rodrigues
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263 (Vol.1)
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  1. Almeida/ Célia Teixeira/ D. Murcho/P.Mateus/Pedro Galvão
Didáctica
21.00€(2 Volumes)
236 (Vol.1)
200 (vol.2)
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Fórum on line, cd rom, site de apoio
Logos
António Lopes e Paulo Ruas
Santillana/Constância
24.50€ + 4.50€ caderno aluno
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20.90€ + 5.50€ caderno aluno
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Filosofia 10
Maria Margarida Moreira
Areal
21.90
240
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Um outro olhar sobre o mundo
Maria Antónia Abrunhosa/Miguel Leitão
Asa
25.00€
303
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Sem indicações
Criticamente
Artur Polónio/Faustino Vaz
Porto
21.90€
271
Não tem
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Contextos
Marta Paiva/Orlanda Tavares/J.Ferreira Borges
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Manual integrado (barra lateral)
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Phi
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Texto
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Introdução…
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Pensar Azul
F.Alves/J.Aredes/J.Carvalho
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23.99€
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Cd rom e apoio na Internet (não especificado)
Este Amor Pelo Saber
Amândio Fontoura/Mafalda Afonso
A Folha Cultural
22.95€
336
Não tem
Não tem
Não tem
 
 

Pergunte aos filósofos! Eles respondem.

Imagine uma equipe de filósofos sempre disponíveis para resolver os enigmas racionais a que diariamente estamos sujeitos! Essa equipe existe. São professores em universidades americanas e prontificam-se a tentar esclarecer dúvidas filosóficas. Para além de tudo abrem as portas da filosofia a quem dela ainda tem pouca informação. Pesquisar aqui o AskPhilosophers.
Igualmente interessante é o programa de rádio de Ken Taylor e John Perry, da Stanford University, EUA. Passa-se um bom serão a ouvir os dois filósofos discordarem com os seus convidados, filósofos especialistas nas mais variadas áreas da filosofia. Discutem os problemas de modo disciplinado, mas com muito humor quando ele tem lugar. A filosofia só fica a ganhar com este modo rigoroso e disciplinado de a divulgar e discutir. Este programa é uma espécie de agora moderna onde se discute filosofia. No site estão muitos programas disponíveis. Pesquisar aqui.
 
Rolando Almeida

A racionalidade não é uma seita – O pseudo filósofo Bombista

Quando estamos na filosofia e pretendemos ser intelectualmente honestos não podemos defender uma qualquer bandeira atacando outra que julgamos ser perigosa por ser de uma cor diferente na nossa. A racionalidade filosófica exige a discussão argumentativa livre e constitui um desprendimento progressivo dos mitos, fanatismos e preconceitos. Nem a filosofia se faz só para agradar no grupo de amigos. É natural que entre as comunidades de filósofos, alguns se deixem seduzir pelo vedetismo ou qualquer outra inclinação menos racional. Mas tal acontece porque os filósofos estão sujeitos a todos os vícios que qualquer ser humano está sujeito, com a consequente que quem perde aí é a lucidez racional. Na filosofia dizer que gostamos mais de um filósofo que outro, da corrente x em vez da corrente y, significa que temos mais razões para acreditar em x do que em y, que os argumentos em favor de x são menos discutíveis do que os argumentos em favor de y. Em filosofia, defender a teoria y, se essa apresenta argumentos cujas premissas são manifestamente fragilizadas, tem o mesmo significado que continuar a defender o geocentrismo só porque se é da família de algum cientista atrasado, ou porque o presidente de um clube de futebol tivesse afirmado que o geocentrismo é que é engraçado. Numa palavra, defender a teoria y desta forma é o sinal mais evidente de falta de lucidez. Pode acontecer que, como sou amigo de um geocentrista, defendo a sua teoria com toda a energia, nem sequer querendo saber o que está por detrás do heliocentrismo. Passo a ver o heliocentrismo como o inimigo a abater, custe o que custar. Nas sociedades mais fechadas e preconceituosas, este efeito tende a suceder com muita facilidade trazendo ao de cima todos os fanatismos, ignorância e inveja associada. Deixamos de ter razões para defender o indefensável e, por ignorância, pegamos nas armas. Quando pegamos nas armas, acaba-se a discussão. Na história recente da filosofia já não se faz esta caça às bruxas de modo explícito, mas ela acontece muitas vezes velada com a figura da tacanhez e da inveja associada à ignorância, o que produz um efeito explosivo. Seguindo a via mais fácil, a ignorância, que é precisamente aquela que não exige trabalho algum, parte-se para a filosofia aos tiros intelectuais, com insultos baratos, despropositados e ameaças de alerta como se um determinado grupo de filósofos se tratasse de uma seita a abater, uma organização obscura e subterrânea, marginalizada injustamente pela sociedade, mas que é urgente defender atacando tudo e todos com insultos anónimos e hipócritas. Este é o verdadeiro espírito anti filosófico! Não há discussão, não há filosofia e, sobretudo, não há qualquer trabalho precisamente porque o trabalho dá trabalho e ler meia dúzia de bons livros de filosofia, ainda por cima se tivermos de o fazer com muito esforço numa língua diferente da nossa língua mãe, implica realmente muito trabalho. O insulto aparece como a opção mais imediata neste contexto. Perante o que é novo, mais vale insultar do que trabalhar precisamente porque o trabalho para compreender e descobrir o novo exige uma coisa que nunca se fez na vida, trabalhar. É curioso que esta atitude disparatada, regra geral, não costuma acontecer entre os filósofos profissionais. Não que eles por vezes não se aborreçam uns com os outros. Como já tentei mostrar, também alguns filósofos tem mau temperamento de carácter. Mas quando o que está em causa é a filosofia e a racionalidade que lhe cabe cumprir, a melhor forma de objectar uma tese que aparece como diferente é filosofar e não insultar. Isto é básico: o insulto não passa disso mesmo. É um insulto e nada mais. Uma ideia sustentada com fortes razões é muito mais que um insulto. É motivadora de progresso e inovação, se a ideia a defender for realmente apoiada em razões fortes. Mas para ter razões fortes é necessário reunir algumas condições, sendo as principais:
1 – Estudar os argumentos e teorias contrárias à sua; encontrar pontos frágeis na teoria a atacar.
2- Ter a mente aberta e lidar bem com a possibilidade do erro.
Este último ponto possui até um lado muito curioso. É que a tarefa do filósofo é encontrar erros de raciocínio nos argumentos, sabendo que essa é a melhor via para caminhar para a verdade. Também o futebolista procura encontrar erros nos treinos que faz para apresentar um bom rendimento no jogo a valer. Nenhum jogador de futebol com o juízo perfeito se limita a sentar-se na bancada no dia do jogo a insultar o adversário para o vencer. E porque razão um filósofo tomaria esta atitude em relação aos argumentos de um outro filósofo? Faz isto algum sentido? Ou porque razão um filósofo começaria a difamar outro somente por inveja? Não quero dizer que estas situações não possam acontecer mais vezes que as desejáveis. Caso contrário, não sentiria a necessidade de escrever este texto. A realidade é que acontece, não vale a pena escondê-lo. O que quero aqui mostrar são as insuficiências desta atitude e o desprestigio que tal atitude traz à filosofia, não a beneficiando em absolutamente nada. Isto é particularmente grave quando se passa com filósofos ou gente envolvida na filosofia. Quem o faz não se dá conta, tomado que está pela inveja e mesquinhez, que não está a destruir o adversário, mas antes a destruir a própria filosofia. A última coisa que um filósofo ou professor de filosofia deseja ouvir de um interlocutor é um “não sei, nem me interessa. Não quero saber e só penso o que me apetece”. Se esta atitude contraproducente parte de gente ligada à filosofia, que faz dela a sua profissão e que é pago para a divulgar, aquilo que se está a fazer é assassinar a própria filosofia. Por outro lado, como em qualquer saber ou conhecimento, há que reconhecer o que é realmente relevante em filosofia e acessório. E não há qualquer necessidade de insistir somente por teimosia no que é acessório ou irrelevante. Interessa sim, pensar racionalmente nos problemas. E isto porque a razão e o seu uso é livre e não pode ser confundida com uma seita que se defende irracionalmente. De resto este é um problema que já Kant nos tinha alertado, muito a propósito do que se estava a passar no seu tempo, o Iluminismo que, em duas palavras e só para que não esqueçamos, consiste num uso livre e indeterminado das nossas capacidades racionais.
Rolando Almeida

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Blog de divulgação da filosofia e do seu ensino no sistema de ensino português. O blog pretende constituir uma pequena introdução à filosofia e aos seus problemas, divulgando livros e iniciativas relacionadas com a filosofia e recorrendo a uma linguagem pouco técnica, simples e despretensiosa mas rigorosa.

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