Fama e argumentos maus
Hoje estava com a TV ligada nas notícias enquanto me preparava para sair de casa. Estava a transmitir em directo a despedida do papa da sua visita a África (não tenho a certeza se é a despedida ou a chegada a Luanda, já que não vi a reportagem toda). Não deixei de notar o temor com que os jornalistas falam quando se referem ao papa. Afirmam sem hesitação que não concordam com o que o papa disse em relação ao uso do preservativo nas relações sexuais, mas que não colocam em causa a moralidade do papa, já que ele é uma autoridade moral. Fiquei, após ouvir este tipo de afirmações corroboradas vezes seguidas, a pensar para que raio temos nós filosofia moral se temos o papa? Se o papa diz, a verdade é revelada.
Mas há aqui um sinal que me parece claro: se o que o papa disse em relação ao preservativo fosse dito por um outro ser sem a relevância mediática do papa ou do Michael Jackson, seria desde logo classificado como absurdo e criminoso. Como foi dito pelo papa, o mundo inteiro desfaz-se em desculpas de um argumento mau usado pelo papa e que mais não nos diz senão a sua falibilidade como ser humano para além de deixar claras as fragilidades morais de uma instituição inflexível que muitas das vezes promove imposições morais sem sequer pensar muito no assunto. Peter Singer pretendeu fazer uma ética à margem da tradição judaico cristã e mostrou claramente que tal ética não só é possível, como é adequada ao pensamento humano. Não se percebe de resto num mundo democrático como o jornalismo parece ser um apêndice do Vaticano.
Mas para pensar correctamente sobre o mau argumento do papa ( e é verdade que o homem tem direito a usar maus argumentos como qualquer ser humano) basta pensar se temos argumentos maus em favor da tese que defende que não devemos usar o preservativo nas relações sexuais, de modo a evitar a propagação de um vírus mortal.