Resposta a quem toma Klossowski por obscuro
Encontrei esta resposta de uma leitora - no seu blog - (clicar na imagem para aceder), uma vez que o espaço dos comentários do meu blog não permitem uma resposta mais longa (podia ter feito em duas partes). Bom, eu não me importo mesmo nada de ceder o espaço do meu blog para mostrar o desânimo da leitora por eu não ter referido Klossowski como um autor de extrema importância no panorâma da filosofia actual. Mas eu não o referi porque o autor não tem essa importância, tal como não a tem milhares de outros autores. A minha heresia despoletou uma pequena guerra. Por regra não entro em guerras, mas resolvi ver até onde uma guerra de palavras pode chegar. Não vi, pois não tem fim. Provavelmente, a minha leitora depois faz um post de resposta a este para me liquidar como pessoa, só porque eu referi aquilo que é verdade, que Kolossowski não é um autor central na filosofia. Bem, a estratégia da guerra consiste mais ou menos em acusar o outro do que nós próprios fazemos. Um pequeno exemplo: imagine o leitor que eu lhe dou respostas com citações de livros, mas depois acuso-o que você segue uma filosofia que não é mais do que citação atrás de citação. Mais um outro exemplo: imagine que eu o acuso de separatismo na filosofia, mas o meu discurso resvala sempre para um anti qualquer coisa. Não me impressionou a resposta da leitora. As pessoas são livres de estudarem o autor X ou Y. O que mais me chamou a atenção é que a leitora predispôs-se muito rapidamente a colocar em causa uma série de aspectos, incluindo a minha vida profissional no seguimento de não considerar um autor como central (e que não é mesmo). Mais à frente sou acusado de possuir pouco rigor nas minhas afirmações. Dá que pensar. Não sei quem é esta minha leitora muito menos se tem alguma actividade na filosofia, uma vez que, apesar da minha identidade estar completamente revelada, o contrário nem sempre acontece, o que me parece injusto. Bom, claro que já há algum tempo aprendi que as disputas filosóficas valem a pena, sempre, mas as demonstrações de força por regra não conduzem a qualquer resultado. Mas fica a história, pronta a digerir entre um jogo do europeu e um prato de tremoços.
Rolando Almeida
6 Junho 2008
Aos professores e leitores de Filosofia
Caro senhor,
Respondo-lhe aqui porque o espaço dos comentários do seu blog me impõe um número limitado de caracteres, aproveitando também para estender este debate a quem se interessar por ele.
A centralidade de um autor no âmbito da Filosofia não é, ao contrário do que alguns professores possam pensar, ditada por eles, já que nenhum sujeito tem o direito de impor ditatorialmente a outrem o seu sistema de referências. Assim sendo, o que torna Klossowski um pensador incontornável não são «bitaites» de um adepto (como se de futebol se tratasse) que coleccionasse e guardasse os cromos dos seus jogadores favoritos na prateleira, mas sim a própria História.
Quando desclassifica esse autor como «obscuro» e «banha da cobra» e, nas suas palavras, «uma data de gente reage como se tivesse cometido uma heresia», aquilo que cai sobre si é o peso da História, enquanto memória e apreciação colectivas. Essa reacção é, aliás, de louvar, pois demonstra, não só que Klossowski é reconhecido como um marco para os reais leitores de filosofia, como demonstra que há leitores de filosofia – duas razões para alguém que se interesse por Filosofia ficar contente.
Um pouco mais de moderação quando se referir a Klossowski, não vá dar-se o caso de se encontrar num meio académico sério (porque também há os que não o são), e acabarem a desconsiderarem-no a si por «pura ignorância» de conceituadas obras no universo filosófico como «Nietzsche e o Círculo Vicioso» (obra dedicada a Deleuze e considerada por Foucault “o maior livro de filosofia que alguma vez li, incluindo a obra do próprio Nietzsche”) e «A Moeda Viva» (“o mais elevado livro da nossa época”, diz novamente Foucault), entre outras.
É que, na qualidade de professor de Filosofia, não tem obrigação de conhecer tudo mas tem o dever de, pelo menos, não negar à partida aquilo que desconhece. É para isso que lhe pagam.
Gostará talvez de saber que Klossowski traduziu para o francês importantes textos de Wittgenstein (que é a grande referência do seu estimado Kripke), assim como de Heidegger, Nietzsche, Benjamin, etc.
Não acho estranho que, como o caro senhor, haja quem considere Kripke «um dos filósofos mais centrais do século XX» (século marcado por duas guerras mundiais, duas grandes catástrofes atómicas e vários acidentes nucleares, movidos em nome «da busca séria e rigorosa» da razão e do progresso científico), contanto que me conceda que «um dia o século será deleuziano». E tanto melhor para nós se for já o século XXI!
Quanto à sua observação de que «a verdade não é uma lotaria», ficaria espantado com as vozes que se levantam, vindas do seio da própria comunidade filosófica, afirmando que «pensar é lançar os dados».
E para que continue a dita «busca» filosófica, deixo algumas pistas em forma de link (não significa que as subscreva por inteiro, mas não é isso que importa):
- Sobre «Nietzsche e o Círculo Vicioso» de Klossowski
- «A teoria de Kripke é muito menos espantosa do que pode parecer à primeira vista» - Desidério Murcho
Cordialmente,
Sónia